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Agosto Lilás: 19 anos da Lei Maria da Penha e a luta diária contra a violência às mulheres

Por Maria Eduarda
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O Agosto Lilás é dedicado à conscientização e ao enfrentamento da violência contra a mulher. A campanha acontece anualmente neste mês, pois marca o aniversário da Lei Maria da Penha, um marco na defesa dos direitos femininos no Brasil. Ao longo do período, diversas ações são promovidas para sensibilizar a sociedade e fortalecer a igualdade entre homens e mulheres, incluindo palestras, debates, seminários, workshops e campanhas em mídias tradicionais e redes sociais. No entanto, diante dos números ainda alarmantes de casos de violência, surge a reflexão: será que essas ações estão realmente sendo suficientes?

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O Portal R10 colocou em pauta a discussão sobre a violência contra a mulher, abordando suas implicações na vida das vítimas e as ações que os órgãos públicos têm adotado para combater um problema que não para de crescer.

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A Lei Maria da Penha foi sancionada em 7 de agosto de 2006 e completou, na última quinta-feira, 19 anos de existência. Criada para prevenir e combater a violência doméstica e familiar contra a mulher, independente da orientação sexual. A legislação reconhece cinco tipos de violência: física, psicológica, sexual, moral e patrimonial. Essas formas de agressão, muitas vezes interligadas, causam impactos profundos na vida das vítimas e representam uma grave violação dos direitos humanos. Mas, afinal, o que diferencia cada uma delas?

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Violência física: 

  • Espancamento
  • Atirar objetos, sacudir e apertar os braços
  • Estrangulamento ou sufocamento
  • Lesões com objetos cortantes ou perfurantes
  • Ferimentos causados por queimaduras ou armas de fogo
  • Tortura

Violência psicológica: 

  • Ameaças
  • Constrangimento
  • Humilhação
  • Manipulação
  • Isolamento (proibir de estudar e viajar ou de falar com amigos e parentes)
  • Vigilância constante
  • Perseguição contumaz
  • Insultos
  • Chantagem
  • Exploração
  • Limitação do direito de ir e vir
  • Ridicularização
  • Tirar a liberdade de crença
  • Distorcer e omitir fatos para deixar a mulher em dúvida sobre a sua memória e sanidade (gaslighting)

Violência sexual: 

  • Estupro
  • Obrigar a mulher a fazer atos sexuais que causam desconforto ou repulsa
  • Impedir o uso de métodos contraceptivos ou forçar a mulher a abortar
  • Forçar matrimônio, gravidez ou prostituição por meio de coação, chantagem, suborno ou manipulação
  • Limitar ou anular o exercício dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher

Violência patrimonial: 

  • Controlar o dinheiro
  • Deixar de pagar pensão alimentícia
  • Destruição de documentos pessoais
  • Furto, extorsão ou dano
  • Estelionato
  • Privar de bens, valores ou recursos econômicos
  • Causar danos propositais a objetos da mulher ou dos quais ela goste

Violência moral: 

  • Acusar a mulher de traição
  • Emitir juízos morais sobre a conduta
  • Fazer críticas mentirosas
  • Expor a vida íntima
  • Rebaixar a mulher por meio de xingamentos que incidem sobre a sua índole
  • Desvalorizar a vítima pelo seu modo de se vestir

Controle, agressões e traumas

O Portal R10 entrevistou uma vítima de violência doméstica, que prefere permanecer no anonimato. Mãe de quatro filhos, relata as dificuldades que enfrenta diariamente e os desafios de conciliar seu cotidiano com a dor e o medo que a acompanham. Criada em uma infância rígida, em que só podia sair acompanhada dos pais e era ensinada a cuidar da casa e dos filhos, ela conheceu seu marido aos 15 anos e passou a morar com ele aos 16. Hoje, com 16 anos de casamento, recorda que, na época, ele já tinha 20 anos e consumia bebidas alcoólicas.

No início, tudo parecia perfeito, o relacionamento era tranquilo, ele trabalhava e ela cuidava da casa. Sentindo-se sozinha, ela mencionava que queria visitar a casa dos pais, mas ele já não permitia. Foi a partir desse controle que começou o cotidiano de violência. “Ele dizia para todos na rua que eu podia sair para qualquer lugar, mas não era assim. Quando começou a beber com frequência, passou a me dirigir com palavras ofensivas e humilhantes". 

Ela relata ter sofrido diversos tipos de violência e se sente profundamente abalada. Os episódios de agressão se tornaram mais frequentes após os dois primeiros anos de relacionamento. Os filhos, traumatizados, vivem com medo do que o pai pode fazer quando chega em casa embriagado.

"Ele saía todo dia para trabalhar e voltava completamente bêbado, me xingando e me ameaçando. Mandava mensagens dizendo que, ao chegar em casa, ia me matar, acusando-me de estar com outro homem. Se não encontrasse a comida pronta, apagava o fogo e jogava as panelas fora. Pegava meu prato e o derrubava, me mandando comer no inferno, na frente de qualquer pessoa. Meu coração disparava de medo quando ele chegava em casa. Ele já perfurou portas com facas, me derrubou da moto e chegou a me agredir quando eu estava grávida da minha filha", enfatizou.

Na tentativa de chamar a atenção dele e discutir sobre as agressões para que não se repetissem, ela chegou a gravar áudios e tirar fotos, mas seus esforços nunca surtiram efeito. “Já filmei e tirei fotos, mas ele nunca deu ouvidos. Eu enviava os vídeos para ele, mostrando as agressões e o que ele dizia para mim.”

Atualmente, ela realiza acompanhamento psicológico para lidar com os traumas sofridos. “Comecei a conversar com a psicóloga e estou começando a compreender minha vida, pois as agressões física, psicológica e sexual fizeram parte dela". 

O medo a impedia de falar com outras pessoas sobre o ocorrido, afetando até mesmo seu dia a dia com os filhos. Ela vivia estressada e aflita, sempre com medo do futuro. “Ele dizia que eu nunca seria feliz apenas com meus filhos, que ia viver mendigando, pedindo de um lado e de outro para conseguir sustentar minha família. Ele dizia que eu não seria ninguém, que não ia trabalhar e que viveria uma vida terrível”.

“Nenhuma mulher deveria passar pelo que eu passei, porque isso não é vida. A primeira vez que ele me agrediu foi porque a comida não estava pronta; ele me deixou toda roxa. A segunda vez foi por ciúmes: ele dizia que eu estava tendo um caso com outro homem e chegou a comprar gasolina para me incendiar, sorte que consegui correr depois da agressão. A terceira vez aconteceu na casa da minha família, com meu filho no colo, porque caí em um golpe envolvendo dinheiro”, relatou.

Ela chegou a registrar dois boletins de ocorrência, mas não sentiu apoio nesse processo, mesmo com a existência de leis de proteção à mulher. “Já solicitei ajuda duas vezes. Na primeira, fui negada e não recebi apoio. Chamei a polícia, mas não obtive assistência; diziam que estavam ali por mim, mas não agiam como tal. Acredito que, se houvesse um suporte mais efetivo por meio da medida protetiva, muitas mulheres não morreriam'. 

Este é apenas um caso entre muitos que acontecem todos os dias. De acordo com o Anuário de Segurança Pública, em 2024 os registros policiais indicaram aumento em diversas formas de violência contra as mulheres. No último ano, pelo menos quatro mulheres morreram diariamente vítimas de feminicídio no Brasil, totalizando 1.492 mulheres ao longo do ano. Além disso, ocorrem mais de 10 tentativas de assassinato por dia. Em 80% dos casos, o agressor era companheiro ou ex-parceiro da vítima. Ao menos 121 mulheres foram mortas nos anos de 2023 e 2024 mesmo com Medidas Protetivas de Urgência ativas no momento da morte.

O papel da Secretaria de Mulheres do Estado do Piauí (Sempi) 

A secretária das Mulheres do Estado do Piauí, Zenaide Lustosa, falou sobre os objetivos da campanha deste mês e destacou a importância da atuação conjunta do Estado e da sociedade nesse processo.

"O Agosto Lilás é uma campanha de sensibilização junto à sociedade. Neste mês, a Lei Maria da Penha completou 19 anos, e buscamos dialogar com a população sobre os tipos de violência, os canais de denúncia disponíveis e a importância de as mulheres não se calarem. O Estado tem seu papel, mas a sociedade também pode contribuir para que possamos avançar no enfrentamento da violência contra meninas e mulheres", destacou. 

Segundo ela, estão sendo desenvolvidas ações práticas para conscientizar e mobilizar a população, com foco principal na promoção de políticas públicas voltadas à educação. "Nós lançamos o Agosto Lilás, este ano, com o foco de fortalecer políticas dentro da educação, pois ela é um espaço fundamental para a desconstrução do machismo. É um ambiente onde é possível trabalhar as relações de poder entre meninos e meninas, mulheres e homens e, por meio desse processo formativo no sistema educacional, alcançar o respeito mútuo".

A secretária destacou os avanços e desafios na implementação da Lei Maria da Penha no estado. Segundo ela, embora a lei seja uma das mais conhecidas a nível mundial, ainda há muito a ser feito, especialmente nos municípios do interior, onde a interiorização das ações ainda é limitada. Zenaide ressaltou que a Lei Maria da Penha não é apenas punitiva, mas também preventiva, prevendo mecanismos de proteção às mulheres, como os Centros de Referência da Mulher.

Zenaide acredita que a inclusão das mulheres no mercado de trabalho contribuirá para a redução dos índices de violência, uma vez que, ao conquistar sua própria renda, elas se tornam menos vulneráveis financeiramente à família ou ao parceiro, rompendo o ciclo de violência. Dentro da secretaria, são oferecidos cursos de capacitação totalmente gratuitos para as mulheres. Além disso, a secretaria oferece serviços de cidadania voltados a fortalecer mulheres em situações de vulnerabilidade. 

"Estamos realizando um trabalho tanto nos municípios quanto aqui em Teresina, promovendo oficinas e oferecendo outros serviços de cidadania para fortalecer mulheres em situação de vulnerabilidade. Nosso trabalho não se limita apenas às mulheres vítimas de violência; também atendemos aquelas que se encontram em situações de vulnerabilidade", enfatizou. 

A questão orçamentária ainda é um dos maiores desafios para que a lei seja efetivamente aplicada. "Para implementar um serviço, como a criação de mais varas especializadas da mulher ou a ampliação dos Centros de Referência, é necessário um planejamento orçamentário adequado que permita avançar de forma consistente", destacou a secretária. 

Segundo dados do DATASSP, entre 2022 e 2025, o Piauí registrou 182 casos de feminicídio. Em 2024, foram contabilizados 56 casos, representando um aumento de 32% em relação ao ano anterior. Em 2025, até março, já foram confirmados 18 feminicídios, indicando uma tendência de crescimento. Além disso, apenas 10 em cada 100 mulheres vítimas de feminicídio contavam com medida protetiva, e 87,85% das vítimas não haviam registrado boletim de ocorrência antes do crime.

Ao ser questionada sobre as possíveis causas desse índice tão expressivo, Zenaide destacou a presença de uma sociedade patriarcal e a persistência do machismo nas instituições e na vida cotidiana. " Vivemos em uma sociedade patriarcal, onde o machismo é fortalecido tanto nas instituições quanto na sociedade. Se não desconstruirmos o machismo e não houver um trabalho conjunto entre a sociedade e os governos municipal, estadual e federal para repensar essas relações de poder, não conseguiremos avançar". 

Ela também deixa uma mensagem para as mulheres que enfrentam situações de violência.

"Não silencie. Quando você se cala, silencia a si mesma e a outras mulheres. Procure ajuda". 

Canais de denúncia e apoio:

  •  0800 000 1673 (WhatsApp 24h)
  • Ligue 180
  • Disque 190 – Polícia Militar
  • (86) 99432-6900 – Ouvidoria Secretaria da Mulher-PI

Em Teresina:

Casa da Mulher Brasileira – Av. Roraima, 2563, Aeroporto.

No seu município, procure:

CRAS, CREAS, UBS, Polícia Militar, DEAMGV ou Delegacia de Polícia.

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