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A coragem é uma virtude essencial para vivermos. Tomar uma atitude é, às vezes, um movimento difícil e controverso. Esse momento de coragem não segue script. Ele surge no ínfimo de tempo de um clique. Invariavelmente, os grandes momentos da vida emergem de um ato inesperado, assim aconteceu quando, em 1626, o holandês Pierre Minuit comprou por 60 florins, equivalente a 24 dólares, a ilha de Manhattan de nativos locais. Muitos o consideraram maluco por adquirir uma ilha com vegetação densa e infestada de insetos. O tempo escreveu que a coragem de Minuit fez com que nascesse a cidade mais globalizada do mundo: Nova Iorque.

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Pois bem, a coragem foi vista há pouco tempo num evento corporativo em Teresina. No palco, um dos maiores influencers do país, autor do best-seller “Do Mil ao Milhão”, Thiago Nigro. Na plateia, empresários, herdeiros, profissionais liberais e executivos. No meio da fala de Nigro, uma provocação lançada aos participantes: qual a diferença entre preço e valor? Para exemplificar, o influencer levanta um exemplar físico de seu livro e cutuca: quanto vale este livro? Alguns responderam, cinquenta reais na Amazon. A partir daí, ele insistiu na pergunta, só que inserindo, nível a nível, novos atributos e benefícios ao produto. Dedicatória, número de WhatsApp, visita à sua empresa, horas de consultoria personalizada para quem adquirisse o livro. A palestra rapidamente ficou mimetizada numa espécie de leilão: quinhentos reais, mil, cinco mil, quinze! Um dos participantes sobe no palco e, ao lado do popstar influenciador, passa a dar lances sob os holofotes. Fim da história: o livro foi arrematado por 80 mil reais!

A plateia assistia atônita à cena inusitada. Um empresário, aparentemente em pleno uso das faculdades mentais, acabara de adquirir, publicamente, um exemplar de um livro que, nas livrarias virtuais, custaria algo em torno de 50 reais por insanos 80 mil reais, 1.600 vezes mais caro. Afinal, qual era a jogada? Tratava-se de um exibicionista? Vaidade? Marketing, ostentação? Ausência de inteligência?

Voltando ao momento “dou-lhe uma, dou-lhe duas…”, ao adquirir o livro, o arrematante pulou e fez o gesto que Pelé fazia no momento de um gol. Mas, afinal, foi um gol ou foi um bizarro gol contra? Façam suas apostas. Aqui, talvez, não chegaremos a um veredito. O que não se pode negar é que o gesto do comprador foi um ato de ousadia e, é claro, de coragem!

O leilão citado foi compartilhado em todas as redes sociais do país. Surgiram debates a respeito da loucura ou da genialidade do ato. O que os primeiros transbordos do assunto apontam é para uma repercussão espontânea que, se pudesse ser metrificada, colocaria o arremate do livro como uma excelente aquisição de engajamento e uma possível relevância.

Qual o desdobramento disso? Nigro o chamará para uma sociedade ou escreverão laudos psiquiátricos para que o comprador seja considerado uma pessoa com problemas emocionais? Bem, tudo isso e ao mesmo tempo nada disso!

Ao adquirir o livro, o seu comprador, o empresário Liberal Neto, criou um display em sua trajetória. Algo como uma chave que abre o fluxo de interesses de seus potenciais clientes. Mais que isso, a exposição, se for bem trabalhada, amplia as possibilidades de parcerias e de negócios além do “core” do arrematante que virou celebridade. Bem, então estamos falando de um gênio? Não! Estamos falando de quem mirou um objetivo e teve a coragem de acreditar em seu plano. Ah, então estamos falando de um futuro milionário? Não necessariamente, ao mesmo tempo que sim, uma vez que existe por parte dele a famosa permissão, característica essencial para êxitos financeiros. O que aguardar deste caso? Muita repercussão, muitos debates a respeito de gestos ousados ou transloucados. O que não se pode negar é que o livro de 80 mil reais nos tirou a todos de uma cena de cartas marcadas. A aquisição deste livro nos fez perguntar qual o grau de nossa comodidade. Queremos o extraordinário levando uma vida ordinária. O livro de 80 mil reais desnuda uma covardia travestida de prudência. Temos que ouvir mais nosso coração, aliás, etimologicamente, coragem significa “agir com o coração”, e cada um tem uma bitola e uma intensidade para exercer esta ação.

Cliff Villar, jornalista, advogado, diretor corporativo do Grupo de Comunicação O POVO

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